22 de dez. de 2010
Direito de Escolha
1 de dez. de 2010
Molhado
Dias, tardes, noites, semanas e,
As vezes, meses se passam
Sem que paremos para pensar.
Então, um dia ou uma noite qualquer,
A chuva vem e desencadeia uma onda poderosa
De lembranças que nos lançam na cama ou no sofá;
E a gente se afoga na mente, vai de um lado pro outro.
Daí, muitas vezes, resta somente uma opção:
_ Nos conformar com as consequências da liberdade desmedida.
A chuva sempre traz à tona uma série de histórias arquivadas,
Revela verdades submersas,
Alaga e preenche buracos profundos e vazios.
As vezes atroz, as vezes feroz, outras vezes suave.
Se o que deseja é prevalecer seco,
De forma alguma entre na chuva,
Pois ela passa, mas sempre volta para um café!
Agora, se já entrou, só digo que
Quando o que se quer é estar seco
E seco não mais se está,
Pouco ou nada importa se muito ou pouco molhado.
Gustavo Lacerda
16 de out. de 2010
Sem um Nome Meu
Solitário, pulsante, nu.
Sua carne tenra desliza
Entre minhas pernas tremulas.
Sua pele macia me causa arrepios,
E atrai para si cada pelo meu.
Minhas mãos contornam suas curvas,
Que controlam meus batimentos cardíacos
Juntamente com seus lábios firmes,
Beijando cada centímetro até engolir-me
Pela boca minha, que, a cada fuga sua,
Permite os dentes meus cravarem-se em teu pescoço.
Nossos corpos se contorcem e se entrelaçam.
Ora você encarna em mim,
Ora encarno eu em ti.
Nossas carnes se confundem,
Nossas carnes nos dominam,
Tamanho é o desejo de um consumir o outro,
Tamanho é o desejo de um ser consumido pelo outro!
Um raio corta o silêncio e a escuridão.
Acordo nu, só, ofegante e húmido
Você ainda nunca esteve aqui.
Gustavo Lacerda.
À Mesa
Um copo solitário de cerveja morna.
Um par de olhos inquietos,
Que conduzem uma mão firme,
Que suporta dedos fervorosos.
Óculos escuros para uma noite sem luz,
Combinando com a caixa preta de cigarros.
Cigarros para anestesiar o corpo,
Enquanto a vida se dissipa entre um trago e outro.
Um caderno de folhas brancas,
Aos poucos preenchidas em suas linhas de preto.
Uma caneta flutuante,
Que desliza freneticamente em pensamentos incertos.
Um homem branco de camisa xadrez vermelha
Sentado, calado, desafiando-se em versos, descomprometido,
Importando-se apenas com a cerveja e os cigarros, à espera de nada.
Gustavo Lacerda.
A Loira de Vestido Verde
A outra faz o mesmo, a loira.
Olhares perdidos, inquietos tanto quanto as bocas,
Que não falam, apenas trabalham.
A loira de vestido verde ora murmura,
E o outro, com seus olhos fundos, responde.
Os olhos inquietos buscam tudo,
Menos o que está a frente.
As palavras vêm em meias frases.
De repente, um breve beijo
E um afago com cheiro de queijo
Dos dedos da loira de vestido verde.
Verde água, sem vida, pastel,
Assim como os cabelos descuidados,
Combinando com a palidez do parceiro.
Ela tingira os cabelos e vestira-se com cores pastel.
E o tempo juntos era tanto,
Que a falta de assunto tornara-se falta de intimidade.
Gustavo Lacerda.
O Senso e o Vento
Bem mais que o senso,
Que rotulam como tendo de ser bom.
Bem mais que o vento,
Que só não se julga “senhor de si” por não ser racional
- Torna-se pleno de tão intenso.
O senso, quando não é bom, inexiste.
O vento, quando pensa, cessa.
Inexistência é sinônimo de incompreensão.
Ceção é sinônimo de arrogância.
Incompreensão pelo que é diferente do esperado.
Arrogância por se saber necessário e agradável.
Bem mais que o senso!
Bem mais que o vento!
Plenamente intenso, imenso,
O amor que tenho por você.
Gustavo Lacerda.
19 de abr. de 2010
Restauração
Descansam os corpos sem alma estraçalhados
Por uma guerra que pareceu durar desde sempre.
Cada corpo vazio, uma história.
Nevoeiro, escuridão, podridão, desilusão.
A esperança crucificada e aparentemente morta.
Um único batimento cardíaco provoca uma reação em cadeia.
O Céu se rompe e o mundo inteiro estremece.
A Terra é rasgada ao meio e de dentro o fogo
Se ergue, sobe e queima a falta de vida,
Iluminando as trevas de forma ininterruptível.
A capacidade aparentemente perdida de arder é restaurada.
O coração impiedosamente partido é colado.
Os sentidos selados são revigorados.
O fluxo essencial à vida é retomado,
A sensibilidade suavemente liberta,
A escura prisão demolida,
A barreira rompida.
É a vida!
Gustavo Lacerda.
24 de mar. de 2010
Encontros, despedidas, chegadas, partidas

Tudo acontece quando tem que acontecer, sem que possamos prever a hora exata, sem que possamos ensaiar a melhor maneira.
Manhãs, tardes, noites, madrugadas... dias... tudo começa e termina. Isso é previsível, sempre sabemos a hora exata que vai acontecer, mas nem isso sabemos como vai ser, com quem vai ser, até quando vai ser ou se vai realmente ser, se estaremos aqui, vivos, pra ver.
Encontros, despedidas, chegadas, partidas. Não há como ensaiar, devemos nos entregar ao acaso, que de acaso pouco tem... e, por menos que de acaso tenha algo, o controle não está em nossas mãos. O controle é possível? Controle não há...
Algo só chega ao fim quando de fato todas as fontes se esgotaram. Por vezes, uma vida chega ao fim sem que o corpo morra... então uma nova vida deve começar no corpo que prevalece e, para se começar uma nova vida, é necessário zerar absolutamente. Nascer mais uma vez.
Nem todas as despedidas foram como eu gostaria. Nem todas as partidas foram como eu almejava. Tudo simplesmente aconteceu.
As chegadas, os encontros têm sido revigorantes e diferentes do que eu imaginei que poderiam ser. O inesperado tem acontecido com mais frequencia... e tem sido melhor que meus sonhos mais recentes. Tudo está simplesmente acontecendo enquanto eu vivo.
Encontros, despedidas, chegadas, partidas. Mais encontros e chegadas que despedidas e partidas - é o que se tem quando o zero é absoluto ou mais perto possível disso.
Chegadas e encontros. Zero absoluto.
29 de jan. de 2010
Surdez
Houve um tempo em que olhos, ouvidos e mente
Interessavam-se pelo sentimento.
Mas eis que o super-ego ascendente
Mudou todos os focos para o pensamento,
Que vem de dentro e bloqueia a entrada da caverna.
Há quem ouça e não compreenda.
Há quem mude de assunto no apse do sentimento.
Há quem se interesse, mas se perca por um momento,
Que dura não mais que o arrependimento,
Que assola por este investimento de tempo
Sem retorno, mas com frases que rimam como se feitas para cordel.
Acostumaram-se tanto a não ter quem ouça,
Que, quando têm, esquecem-se de si
E respeitam a vontade fútil de quem vos ouve.
Acostumaram-se tanto a não ouvir,
Que, quando lhes ocorre o pensamento,
Logo o despejam, mesmo que a custo do atropelamento
E desrespeito à necessidade de quem vos fala.
Contando que ocorra troca,
Sempre ouça quem vos fala.
Nunca fale com quem não te ouça.
Me acostumei tanto a não ter com quem falar,
Que pouco falo até comigo mesmo.
Olhos abertos, ouvidos atentos,
Mentes dispersas: sou vítima dos pensamentos.
Não meus – os teus, dos outros, de todos.
Desisti de falar, cansei de ouvir.
Gustavo Lacerda.
7 de jan. de 2010
Sua Falta
Pratico com afinco o desapego
Àqueles por meio dos quais desafogo
As mágoas, que não merecem minhas lágrimas.
Desafogo a tristeza e a lanço,
Em forma de incerteza, nos braços abertos
Daqueles que, por ternura, vêm para me salvar.
Não matarei afogadas essas mágoas.
Deixa-las-ei no árido deserto da solidão,
Escaldando sob a luz do dia,
Petrificando às sombras da noite.
Desejo vê-las morrerem secas!
Na falta que você me faz,
Atiro alucinado, para todos os lados,
Com minha arma carregada de desprezo.
Você me manda cortar os pulsos agora,
E eu o obedeço para que veja
Que não há mais sangue,
Que já não sinto dor alguma,
Que, sem você, o que existe apenas um corpo oco.
Traga-me de volta o sangue,
Beije-me para que eu sinta a dor
Que consiste unicamente em nosso amor.
Devolva-se ao nosso mundo!
Na falta que você me faz,
A morte em vida é insuperável,
A escuridão da noite imensurável
E a alvorada inalcançável.
Salve-me antes que meu veneno
Ácido corroa tudo o que era pleno
E desole todos os bons corações a minha volta.
Gustavo Lacerda.