20 de jun. de 2011

O que há no Céu?

Há tardes que terminam com vontade de sol.
Há noites que começam sem o brilho da lua.

Tem dia que a gente não vê o tempo,
E ele passa desapercebido, sem alarde,
Sem sangue, sem suor, sem lágrimas,
Sem quaisquer sentimentos bons ou ruins.

Tem dia que a gente fica apático,
Que o clima fica ameno,
E não faz diferença o que nos aguarda
Ao fim da tarde, ao longo da noite,
No decorrer da silenciosa e solitária madrugada.

Tem alvoradas que são cinzas,
E, nelas, o Sol não dá as caras.
Tem alvoradas que são flamejantes,
E, nessas, o Sol parece lamber o asfalto.

Quanto aos meios-dias?
Ah... Tantos são os meios-dias de fartura,
Nos quais nos empanturramos como se não houvesse estética.
E tantos são os meios-dias de vazio,
Em que nos privamos de tudo por vaidade.

Eu sempre costumo olhar para o céu!
Daí, vejo tudo e nada...
Mais nada que tudo!
E me pergunto: o que há no céu?

O que há no céu além do reflexo do tempo,
Através de corpos celestes extintos?
O que há no céu além de um astro arrogante,
Que nos impõe sua força e nos condiciona
A viver sob a luz de sua existência?
O que há no céu além de uma lua crua,
Tão medíocre, que só brilha pela vontade do Sol?
O que há no céu além de sonhos inalcançáveis?
O que há no céu além da beleza ímpar
De dois gigantes, que nunca estarão lado-a-lado?

Por favor, não venha me falar de eclipses!
Ouço falarem de tantos raros eclipses na TV,
Que duvido da veracidade do adjetivo,
Que faz com que, diferente de mim, tantos olhem para o céu.

Afinal, o que há no céu?

Me perguntam por que sou assim,
Tão ausente e desligado dos outros.
E respondem por mim, sem me ouvir:
“Ah... por que ele quer!”

Mas a verdade nisso tudo,
É que sou tão assim, desse jeito que falam,
Por que eu não quero!

Não quero saber o que se passa.
Não quero ouvir o que se fala.
Não quero ver o que se mostra.
Não quero cheirar o que se cozinha.
Não quero comer do que está posto.
Não quero lamber o que escorre.
Não quero morder o que pulsa.
Não quero preencher nenhum buraco.
Não quero sentir o que quer que seja.
Eu quero absolutamente nada,
Que se relaciona a vocês!

Hum... mas o fato é que, de fato,
Todos possuem sombras densas,
Reveladas de forma tensa
Pela invasiva luz intensa
E vulgar do Sol.

Mas, também, afinal, o que há no céu,
Que se mantém sobre tudo, além do Sol?


Gustavo Lacerda.

7 de jun. de 2011

Não Importa a Farsa

Resolvi hoje caminhar pelos lugares de antes,
Explorar a noite fresca da qual ouvi falarem,
Conhecer as verdades ocultas nas verdades
Dos que me cercam de longe
Com suas opiniões, convicções, seus olhares.

Resolvi hoje caminhar por aí
E, nessa errada, logo percebi
Que, naqueles lugares, o mundo mudou
E a violência come solta, sem decoro algum.

A violência gerada
Pelo estupro emocional vosso
De cada dia, de cada noite,
De cada relação, de cada ausência,
De cada ineficiência de teus provedores.

A violência na forma como cada um se trata,
Não aos outros, a si, em seu intimo,
Em sua individualidade corrompida,
Em sua quase total ausência de vida.

E nessa onda de violência interna,
O que se entende por amor é a melhor saída,
A mais estratégica fuga de si,
O mais extraordinário mecanismo,
Através do qual se pode sentir de tudo,
Relacionando esse tudo a um único ser
Da forma mais calorosa que se possa ver.

Só que de quente só há o tempo,
O Sol escaldante dessa primavera
Nas ruas evaporando secura,
Escancarando a vulgaridade coletiva!

Não importa o que eu faça
E tampouco como se disfarça,
Não consigo me acostumar
A essa cornucópia de sentimentos
Que vulgarmente é rotulada Amor!

Não importa o que eu faça,
Não consigo alimentar nem mais uma farsa
Suficientemente convincente
A ponto de alguém me achar racional
Sem vestir qualquer disfarce

Toda racionalidade é ponderada,
Quando a mente é bem estruturada,
Mas não há mente que não se perca
Diante dessa bendita cornucópia,
Que torna qualquer pessoa sã desequilibrada.

Já não importa o que eu faça,
Duvido da existência da falta de vulgaridade.
E não corro mais, não fujo mais.

Tantas vezes dei e recebi provas de amor.
Tive amores tão densos quanto intensos,
Testados a cada tortuoso pensamento.
Amores dos quais me restou sequer um lamento,
Amores que buscaram em mim não mais que um acalento,
Amores dos quais as lembranças me deixam nem sonolento!

Amor de verdade, acreditei, não existe.
O que existe é uma vontade insana de amar,
Encarnada nas mais insensatas provas de amor.
O que existe são apenas provas de amor.

Daí vem alguém e diz que me ama
E que pretende ter em mim alguém que nunca lhe serei,
Esperando, em troca, me ser isso também.

Esse alguém não é e nunca será
A pessoa mais importante de minha vida.
Nem ele e nem qualquer outro alguém,
Além daquele que já ocupa tão bem
E que cuida, como ninguém, deste lugar.

Por essas ruas muitos passaram.
Naquele portão, por um tempo, alguns ficaram.
Mas, nesta sala, poucos pisaram
E, naquele quarto, nunca entraram,
Além daquele que já ocupa tão bem
E que cuida, como ninguém, deste lugar.

Não corro mais, não fujo mais.
Quem corre são os outros, quem foge são os outros,
Que buscam silenciar seu auto-flagelo
Através de meu fôlego de vida,
Mas que não têm forças para além da passividade.
Bem como não podem esperar e temem se arriscar,
Então correm e fogem.

Já não corro mais, já não fujo mais,
Já não temo mais, já não espero mais,
E, também, não me fecho mais.
Estou aberto, não para aquele tipo, para outro,
Que, talvez, sem violência, entre naquele quarto.
Alguém além deste que já ocupa tão bem
E que cuida, como ninguém, do nosso lugar,
Que não requer cuidados além dos que já tem
Deste que vos declama essa poesia sem rima.

Já não preciso mais ter provas de amor
E, diante delas, imediatamente saberei:
Não é amor, é vontade de amar!
E minha vontade de amar há muito passou.
Naturalidade, verdade e simplicidade: foi o que restou.

Não tenho vontade de amar,
Tenho necessidade de viver
Verdadeira e plenamente tudo que for para ser,
Sem violência, disfarces ou farsas!

Gustavo Lacerda.