8 de jan. de 2013

Fome


Era aclamada por sua beleza, inteligência e singularidade,
Mas se guardava como Dorian Gray a seu retrato,
Por debaixo de um pano, atrás de uma porta,
Protegida por uma intransponível e secular grade de aço;
Rejuvenescida por um pacto com o próprio diabo,
Que a protegia da maturidade estabelecida nas relações,
Nas entregas, nas perdas, nas paixões, nos amores.

Sua depressão era máscara perfeita para a conformidade,
A justificativa para sua falta de posicionamento imediato.

Tinha no sorriso a deformidade de sua tristeza,
Uma anomalia depressiva que sobrepunha sua falta de coragem
Em assumir o que de fato sentia e abraçar o que lhe arremataria.

Pela má compreensão dos sentimentos oriundos das perdas,
Descartava pessoa atrás de pessoa,
Atropelava sentimento em cima de sentimento,
Acumulando objetos inúteis à frente de verdades construtivas,
Verdades que ocupassem de forma invisível (aos outros) o espaço vazio,
Expondo-a aos olhos naturalmente curiosos pelo que é belo.

Escondia-se por trás dos signos de nascimento e ascendência,
Justificando seus receios e endossando os excessos;
Abençoando suas faltas, sua negligencia, seus medos
Sem fundamentos e palavras que a tornassem menos prolixa.

Pelo medo de perder, colocava tudo a perder.
Pelo medo de se apaixonar, se isolava na ilusão
De que é de solidão que melhor se alimentava,
Quando o que de fato buscava era o calor, o fogo,
Não o que queima, mas apenas o que arde e sacia a fome.

Vulgarizava sua fome como sendo intolerável e traiçoeira,
Quando o que precisava era se alimentar
Do único fruto que aplacaria qualquer fome.

Por medo de secar as folhas das árvores e esteriliza-las,
Não levara seus frutos à boca, até que a própria boca transformara-se
Em rocha seca, impermeável e intocável.

Vulgarizara tanto a própria carência em seu vestido justo,
Que sequer notara que ela o vestia com profunda delicadeza.

Mantivera-se nua em pleno inverno mortífero,
Dando aos cortes do indiferente vento a face,
Ao invés de dá-la aos calorosos beijos e afagos
De quem inteiramente e sem receios ou cobranças lhe oferecera alimento.

Não morrera, mas petrificara.

Gustavo Lacerda.

2 comentários:

Ana Carvalho disse...

As pessoas sempre terão fome.
se num for de feijão é de amor.

Ana Carvalho disse...

Tereza <3